As sabias palavras de um Juiz


PODER JUDICIÁRIO DE ASSIS/SP


Proc. N. 535/89
            Vistos.
Valdemar Marques Ernesto,
Nos autos com qualificação,
Foi  apontado pelo João
Como autor de crime funesto.

O Promotor muito durão,
Não teve dúvidas e, num gesto,
Denunciou o infeliz Ernesto
Como terrível Bandidão...

De passado pouco honesto,
Homem levado à breca
Alcunhado por “Fubeca”,
Foi processado sem hesitação...

E lá foi o nosso Ernesto,
Pelo sim e pelo não,
Denunciado pelo João,
Por delito de receptação.

É que o Ernesto, em momento de desconsolo
Trocou um sabiá do peito roxo,
Por um  canário coxo (fls. 58)
Com um tal de “Zé do Rolo” (fls 48 verso).

O sabiá, havia sumido de vista.
Pássaro belo e formoso,
Subtraído de modo criminoso
De Gervásio Baptista.

E, busca aqui, busca lá,
O Ivo Spricido, muito lesto,
Encontrou o sabiá
Com o indigitado Ernesto.

Denúncia recebida, há mais de um aniversário.
Se muita vela e sem velório,
Seguiu-se o interrogatório
E os demais pontos do sumário.

Três testemunhas de acusação (fls. 56/58)
E uma de defesa (fls.64),
Produzindo só incerteza,
Quanto à receptação.

O João, por certo, quer a condenação,
De forma firme e clamorosa.
A defesa pede a absolvição,
Porque inexistente a receptação culposa.

Depois de tremendo trabalhão
É concluído o relatório,
Cumpre partir para o decisório,
E chegar à conclusão.

Afinal, trocar um sabia de asa defeituosa (fls. 56),
Muito embora de peito roxo,
Por um canário coxo,
Não é coisa tão desprimorosa.

Que nos perdoe o João,
Mas isso é coisa do Fubeca,
Pessoa levada à breca,
Que nem sempre faz um negocião.

É que o coitado do Ernesto,
Quando teve o sabiá na vista, por momento pequeno e curto,
Não poderia prever, mesmo que fosse honesto,
Que a ave fosse produto de furto.

E sem culpa clara e evidente,
Demonstrada à exaustão,
Não há denúncia que vá à frente,
Até a condenação.

Por essa razão,
Embora proteste o João,
Para o Ernesto a absolvição,
Nos moldes do 386, inciso VI , da legislação.

E, assim como o sabiá conta de alegria,
Para que o Ernesto durma sossegado,
Após o trânsito em  julgado,
Arquive-se esta  porcaria.

E, para que não haja erro inglório
Registro e publicação,
Comunicação e intimação,
Tudo isso em cartório.

Assis, cidade de nosso orgulho
Que nos apóia e acalenta,
Aos trinta e um dias do mês de julho
De mil novecentos e noventa.

            Antonio Carlos Gonçalves Junior
                            Juiz de Direito

Comentários

Postagens mais visitadas