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Por: Glória Regina Dall Evedove - São Tomé das Letras |
Autos nº 2009/001770
(Número de Controle na Vara).Campinas/SP
Vistos.
Relatório
FELIPE MORAES ZIGGIATTI ajuizou
ação de conhecimento e natureza condenatória, pelo rito ordinário, em face de GENERAL MOTORS DO BRASIL .Alega o
autor ter adquirido veículo GM TRACKER 2.0, em 10/05/2007, no valor de
R$59.990,00. Afirma que, no primeiro período de chuvas fora surpreendido por
poças de água dentro do veículo e, tendo levado o mesmo à concessionária em 24/10/2007 para sanar o defeito, este continuou sem solução mesmo após ter sido
levado por mais sete vezes para tanto.
Alega ainda ter notificado a
requerida por intermédio do PROCON, mas que continuou sem resposta para o seu
problema. Alega não ser possível a substituição do produto pelo fato de ter
sido o mesmo retirado de linha, bem como
o abatimento proporcional do
preço já que não conseguiria
vender o veículo
com tal defeito.
Junta documentos (fls. 24/50).
Com isso requer a
condenação da ré:
“a. A devolução
do valor pago
no veículo, devidamente
corrigida, nos termos
do art. 18,
III do Código de
Defesa do Consumidor;
b. ao pagamento de indenização
por danos morais, punitivos,
reflexos e materiais, tudo em
conformidade com o já exposto nesta
inicial, sugerindo-se, sem
que esta vincule
ou limite a
ampla margem de
discricionariedade de Vossa
Excelência, que os
danos morais e
reflexos sejam, cada
um, arbitrados no décuplo da
soma das condenações anteriores.”.
Citado, o requerido ofereceu contestação (fls. 56/97). Argui preliminar de
decadência. Requereu a
denunciação da lide
das empresas INIPLA
(ALPINI VEÍCULOS), vendedora
do veículo e
da CONCESSIONÁRIA DAHRUJ,
onde foram efetuadas as
tentativas de conserto
do veículo.
No mérito, alega
a inaplicabilidade do
art. 18 do Código
de Defesa do Consumidor, a
ausência de defeitos
que tornem o
veículo inutilizável e a
ausência do defeito
de infiltração. Afirma que
como o autor
não mais teria retornado à
concessionária após 27/02/2009,
devendo-se inferir que
houve a resolução
do alegado problema.
Impugna os demais pedidos. Em seguida,
o autor ofereceu réplica (fls.
124/139). Foi indeferida a denunciação
da lide
(fls. 140), tendo
sido, na mesma
ocasião, designada audiência
de conciliação, que
restou infrutífera (fls.
157). Anote-se a interposição
de três agravos
retidos nos autos
(fls. 162/168, 176/185
e 233/238).
Houve decisão saneadora (fls.
170), tendo sido rejeitada a decadência arguida e determinada a realização de perícia
técnica. O laudo pericial foi laborado e
as partes se manifestaram acerca do mesmo,
tendo a requerida apresentado quesitos
suplementares, devidamente respondidos
(fls. 312/313).
Foi expedida Carta Precatória
para inquirição de testemunha do requerido. (fls. 353/385),
tendo ainda havido
audiência de instrução
e julgamento (fls.
335). Ofertaram ainda as partes
razões finais sob
forma de memoriais.
É, em síntese,
o relatório.
II – Fundamentação. A
ação é
procedente . O autor adquiriu o veículo em 10/05/2007. Já
no mês de outubro do mesmo ano procurou a assistência técnica
relatando o problema
de infiltração de
água no veículo.
Após tentativa vã
de conserto, retornou
novamente as seguintes
vezes, a fim
de solucionar o mesmo
problema - relato
de infiltração, problema
discriminado em todas
as notas de
atendimento juntadas: Em
07/01/2008 (fls. 32)
- relato de infiltração; Em 13/02/08 (fls. 30) -
relato de infiltração; Em 22/04/08 (fls. 29)
- relato de
infiltração; Em 03/06/08(fls.
28) relato de infiltração;
Em 27/02/09 (fls. 26) relato
de infiltração; Em
18/08/09 (fls. 27)
relato de infiltração. Assim, verifica-se que o veículo novo adquirido pelo autor veio de fábrica com
vício, já que, em poucos meses, por diversas vezes, procurou o autor a
concessionária a fim de
solucionar o problema da infiltração.
Desta forma, verifica-se
claramente não somente a incidência do Código de Defesa do Consumidor, mas,
especificamente do seu art. 18, que prevê a responsabilidade solidária do
fabricante do produto o requerido, com a
concessionária, que efetua os reparos
necessários.
Neste sentido é a
jurisprudência do STJ: “RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
VEÍCULO NOVO. AQUISIÇÃO. DEFEITOS NÃO SOLUCIONADOS DURANTE O PERÍODO DE
GARANTIA. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL DEFICIENTE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO
FABRICANTE E DO FORNECEDOR. INCIDÊNCIA
DO ART. 18 DO CDC. DECADÊNCIA. AFASTAMENTO. FLUÊNCIA DO PRAZO A PARTIR DO
TÉRMINO DA GARANTIA CONTRATUAL. 1. Diversos precedentes desta Corte, diante de
questões relativas a defeitos apresentados em veículos automotores novos,
firmaram a incidência do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor para
reconhecer a responsabilidade solidária entre o fabricante e o fornecedor. 2. O
prazo de decadência para a reclamação de vícios do produto (art. 26 do
CDC) não corre durante o período de garantia contratual, em cujo curso o
veículo foi, desde o primeiro mês da
compra, reiteradamente apresentado à concessionária com defeitos.
Precedentes. 3. Recurso especial provido para anular o acórdão recorrido. (STJ
- REsp: 547794 PR 2003/0083271-0, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data
de Julgamento: 15/02/2011, T4 - QUARTA
TURMA, Data de Publicação: DJe 22/02/2011)”.
E tem-se que a
concessionária não efetuou os reparos de maneira satisfatória. Isso se constata
facilmente em decorrência das diversas vezes que teve o autor que retornar à
concessionária, para este fim. Nem se argumente que o autor somente teria
efetuado a primeira revisão de seu veículo aos 20.000 km rodados e que somente
agora, em decorrência do uso é que o veículo apresentou o problema relatado. É
que esteve aquele continuamente em visitas à concessionária, sempre com o mesmo
objetivo, tendo sido a sua última visita em 18/08/2009, não restando ainda
sanado o problema.
Após isso, em 01/07/2009
ajuizou a presente ação, a fim de ver preservados os seus direitos de
consumidor. Ressalte-se ainda que o veículo possuir garantia de 3 anos que
vigeu até maio de 2010 (fls. 269),
conforme informado ao Sr. Perito pelo funcionário da própria requerida, quando
da realização da perícia. Às fls. 313 dos autos, o Sr. Perito esclarece que “As guarnições de borracha das portas do referido veículo,
que têm a função de impedir a entrada de água, entre outros, para dentro do habitáculo,
encontravam- e deterioradas, com aspecto
de ressecada, motivo pelo qual não estavam mais cumprindo a sua função de vedação.
Não é possível afirmar com certeza se a peça estava deteriorada devido à desgaste
natural ou se houve efeito no material (borracha).
Caso a referida deformação tenha ocorrido
naturalmente, é possível afirmar que esta deterioração foi precoce, e não condiz
com a durabilidade esperada desta peça.” Desta forma, verificando-se que
a causa da infiltração de água no interior do veículo do autor foram as borrachas
de vedação que, aparentemente, desde a aquisição do veículo já apresentavam problema e que este não foi solucionado pela concessionária,
de rigor a observância do § º do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, que
assim dispõe: “§ 1º Não sendo o vício sanado no
prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua
escolha: I – a substituição do produto por
outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II – a restituição imediata
da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III – o abatimento proporcional do preço”.
E tendo o autor optado pela restituição da quantia
paga, até porque, de fato, ficam obstacularizadas as demais opções no caso específico,
conforme explanou o autor na sua inicial, de rigor a condenação da requerida na
devolução da quantia paga, monetariamente corrigida, desde o seu desembolso, acrescida
ainda de juros de mora de 1% ao mês, esses
contados da citação. Procedente ainda o pedido de indenização pelos danos morais
pleiteados pelo autor, haja vista o prolongado
aborrecimento que o mesmo teve ao adquirir
um veículo novo que, a princípio, não deveria apresentar reiterado problema, não solucionado pela montadora ou concessionária.
Tal entendimento também é o adotado
pelo STJ: “CIVIL E PROCESSUAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO. REPARO DE VEÍCULO NOVO. DEFEITOS DE FÁBRICA. EXECUÇÕES INADEQUADAS.
SUCESSIVAS TENTATIVAS PELA CONCESSIONÁRIA. ILEGITIMIDADE AFASTADA. ART. 18 DO CDC.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO FABRICANTE E DO FORNECEDOR. SUBSTITUIÇÃO POR VEÍCULO
NOVO. ART. 18. § 1º, I, DO CDC. OPÇÃO DO
CONSUMIDOR. DANO MORAL CONCEDIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. RECURSOS ESPECIAIS
QUE DISCUTEM O INCABIMENTO. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOSENSEJADORES DO DANOMORAL. EXCLUSÃO.
I. Não há violação ao art. 535 do CPC quando
a matéria impugnada é devidamente enfrentada pelo Colegiado de origem, que dirimiu
a controvérsia de modo claro e completo, apenas de forma contrária aos interesses
da parte. II. "Comprado veículo novo
com defeito, aplica-se o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor e não os artigos
12 e 13
do mesmo Código, na linha de precedentes da Corte. Em tal cenário, não há falar em ilegitimidade passiva
do fornecedor"(REsp nº 554.876/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes,
DJU de 17/02/2004).
III. Devida a indenização por dano moral, porém em valor inferior ao fixado, de modo a evitar enriquecimento sem causa.
IV. Cabe ao consumidor a escolha entre a substituição, a restituição do preço,
ou o seu abatimento proporcional em tais hipóteses - art. 18, § 1º, I a III, da Lei n. 8.078/1990. Precedente. V. Recursos
especiais conhecidos em parte e, nessa extensão, parcialmente providos. (STJ - REsp: 912772 RS 2006/0281613-9,
Relator: Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Data de Julgamento: 26/10/2010, T4 –
QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/11/2010)”.
Quanto ao montante da indenização, tendo
em vista o tempo decorrido entre a compra e a resolução do problema, além dos diversos
deslocamentos à concessionária, e tempo de indisponibilidade do veículo, reputo
suficiente para punir a conduta lesiva e
compensar a ofensa experimentada, que seja fixada em R$ 21.720,00.
Porém, não procede o pedido de
indenização pelos danos morais reflexos, requeridos em favor da enteada e da companheira
do requerido. De fato, em conformidade com
o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, o fornecedor de serviços responde objetivamente,
independente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores. Porém,
deve haver a comprovação do dano e do nexo causal. E tenho que no caso dos autos
não houve tal comprovação. Às fls. 44 e 45 foram juntados exame realizado em “Betriz
Bonetto Fernandes” e juntado atestado médico datado de 04/06/2009, afirmando que
“Adriana Helena Bonetto Fernandes” sofre
de rinite alérgica específica de dois tipos de ácaros, bem como sensibilidade importante
a “epitélio de animais-gato”, tendo realizado
tratamento por três anos. Ora, o veículo fora adquirido em 2007, ou seja um anos
após o início do tratamento realizado em
Adriana, ausentes, desta forma, o dano e o nexo causal para a imposição da indenização.
Porém,
procedente o pedido de indenização pelos danos materiais sofridos, em
virtude dos acessórios adquiridos para utilização no veículo, conforme documentos juntados às fls.
46/50, já que serão os acessórios
completamente perdidos com a devolução do veículo.
Cumpre ressaltar, porém, que
a restituição do valor pago pelo veículo dependerá da devolução desse à ré.
III - Decisão
Ante
o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido contido na inicial. Faço-o para condenar a requerida na devolução da quantia
paga, monetariamente corrigida, desde o seu
desembolso, acrescida ainda de juros de mora de 1% ao mês, esses contados da citação, bem como condenar
a requerida em indenizar o autor pelos danos
morais sofridos, no importe de R$ 21.720,00, esses corrigidos monetariamente desde a data desta sentença e juros de mora de
1% ao mês desde a citação; e, ainda, nos danos materiais relativos aos acessórios
pelo autor adquiridos, conforme as notas juntadas com a inicial, corrigidos
monetariamente desde o desembolso e acrescidos
de juros de mora contados da citação.
A restituição do valor pago pelo
veículo dependerá da devolução desse à ré. Considerando que cada litigante foi em
parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados
entre eles as custas e as despesas, arcando cada qual com os honorários dos patronos
que constituiu, nos termos do artigo 21 do Código de Processo Civil. Publique-se, registre-se e intime-se.
Campinas, 14 de julho de 2014.
Fábio Henrique Prado de Toledo Juiz(a) de Direito.
Fonte: Autos nº 2009/001770 (Número de Controle na Vara).