Vaga de garagem: é possível sua penhora e arrematação?




O magistrado Gustavo Henrique Bretas Marzagão decidiu na semana passada questão que é bastante controvertida na doutrina e na jurisprudência.

Vaga de garagem, consistente de unidade autônoma matriculada, pode ser objeto de penhora e arrematação? A vedação estatutária, representada por dispositivo proibitivo de alienação na convenção de condomínio, tem o poder de impedir a alienação judicial?

Para o juiz da Vara Especializada, não.

O oficial registrador acenava para a redação do  § 2º, do art. 1339, do Código Civil, que reza que é permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, “só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembléia geral”.

À parte o fato de que a vaga em questão não figurava, pelo que se depreende da r. decisão, como parte acessória do apartamento, consistindo em unidade autônoma, com matrícula própria e individualização destacada no condomínio, a alienação a terceiro, estranho ao condomínio, foi admitida nesse caso concreto.

O argumento é claro é direto: trata-se de decisão judicial; as vedações legais e convencionais, dirigidas e vinculando essencialmente os particulares, cedem passo à supremacia do interesse público representado pela decisão jurisdicional. No caso concreto, a vedação da convenção de condomínio foi afastada, na justificativa de que a hipótese versava sobre alienação forçada (judicial) – não voluntária.

Ocorre que as convenções condominiais ostentam claro caráter estatutário, representando a cristalização de interesses do condomínio, resultado de um contrato coletivo em que a comunidade, reunida em assembléia, dispõe sobre os interesses específicos daquele grupo. Como superar essa pletora de direitos sem a participação do condomínio, devidamente representado por seu síndico? A coisa julgada pode ultrapassar a esfera jurídica das partes litigantes e colher um interesse geral representado pela convenção do condomínio que expressamente veda a aquisição por terceiros alheios à comunidade?

O tema é palpitante. O magistrado não está sozinho em sua posição e conta, inclusive, com apoio de remansosa jurisprudência dos Tribunais superiores. Vale a citação do REsp 977004/RS, assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA DE VAGA DE GARAGEM COM MATRÍCULA PRÓPRIA, DISTINTA DAQUELA DO IMÓVEL RESIDENCIAL DO DEVEDOR. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. É possível a penhora de vaga de garagem com matrícula própria, por tratar-se de unidade autônoma, distinta daquela que integra o imóvel residencial do devedor. Hipótese que não se enquadra no art. 1º, da Lei nº 9.009/90. Precedentes.

2. Recurso especial não provido.

Uma vez mais a Primeira Vara de Registros Públicos inova. (SJ)

Carta de arrematação – Condomínio – vaga de garagem – unidade autônoma.

Ementa não oficial: Possível a arrematação de vaga de garagem (unidade autônoma) nas hipóteses de alienação forçada (judicial) e não voluntária – malgrado o fato de restrição contida em convenção e especificação do condomínio.

Processo 100.09.170393-6 – Dúvida de Registro de Imóveis – 13º Oficial de Registro de Imóveis da Capital – Carlos Augusto Mello de Macedo Costa. .CP. 299. – ADV: CARLOS AUGUSTO MELLO DE MACEDO COSTA (OAB 212501/SP)

VISTOS.

Cuida-se de dúvida suscitada pelo 13º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, que recusou o registro da carta de arrematação da vaga de garagem matriculada sob nº 28.695, daquela Circunscrição Imobiliária, ao argumento de que a convenção de condomínio não permite sua alienação a terceiros estranhos aos condôminos.

A dúvida foi impugnada às fls. 69/73.

O Ministério Público manifestou-se no sentido de improcedência da dúvida (fls. 75/79).

É O RELATÓRIO.

FUNDAMENTO E DECIDO.

A vaga de garagem arrematada é do tipo autônoma, com matrícula própria no cartório de Registro de Imóveis, de modo que não se caracteriza como acessório do imóvel residencial (v. matrícula fls. 52/54).

Nesses casos, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que é possível a penhora de vaga de garagem com matrícula própria, por tratar-se de unidade autônoma, distinta daquela que integra o imóvel residencial do devedor. Hipótese que não se enquadra no art. 1º da Lei n° 9.009/90. Precedentes. 2. Recurso especial não provido.” (REsp 977004/RS).

No mesmo sentido, o E. Tribunal de Justiça de São Paulo já entendeu que: “Outrossim, cumpre destacar que o apartamento e o box de estacionamento tratam-se de imóveis distintos, com matrículas diversas, anotando a circunstância da vaga não ser determinada conforme consta no registro de imóveis.

Diante de tais peculiaridades, tenho que se apresenta correta a constrição somente da unidade residencial, que por si só basta para garantir o débito, anotando que a legislação civil em vigor autoriza a alienação da garagem com expressa autorização, restando evidente que não se encontra vinculada inexoravelmente ao apartamento.” (AI nº 908514-0/1).

No caso em exame, aduz o Oficial que, de acordo com o § 2º, do art. 1339, do Código Civil, a carta de arrematação não pode ser registrada em virtude da vedação da cláusula IX, da especificação do condomínio, que veda a alienação de vagas de garagem a terceiros estranhos ao quadro de condôminos.

Sucede que, como bem discorreu o Ministério Público, a hipótese em questão versa sobre alienação forçada (judicial), e não voluntária, o que afasta a restrição contida na cláusula IX, da especificação do condomínio, reservada às alienações voluntárias.

Tanto assim é, que o § 2º, do art. 1339, do Código Civil, dirige a vedação ao condômino, em evidente demonstração de que se refere apenas aos atos de alienação voluntários, e não aos forçados como o judicial.

Posto isso, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo 13º Oficial de Registro de Imóveis, a requerimento de CARLOS AUGUSTO MELLO DE MACEDO COSTA, cujo título objeto da dúvida foi prenotado sob o nº 231188.

Para os fins do art. 203, II, da Lei nº 6015/73, servirá esta de mandado, nos termos da Portaria Conjunta nº 01/08, da 1ª e 2ª Varas de Registros Públicos da Capital.
Nada sendo requerido no prazo legal, ao arquivo.

São Paulo, 15 de setembro de 2009.
Gustavo Henrique Bretas Marzagão
Juiz de Direito

Publicado por: Sérgio Jacomino
Categoria: Biblioteca do Registro, Kollemata

Comentários

Postagens mais visitadas