suprimento de consentimento
Vistos.
Geraldo de Castro Marques, menor púbere, com 18 anos de
idade, requereu à este Juízo suprimento de consentimento para casamento,
alegando o seguinte:
1) que
iniciou namoro com a Srta Imaculada Conceição Silva, namoro este que com o
correr do tempo, foi descambando para a licenciosidade até que a jovem se
entregou por inteiro ao seu amado;
2) que dos freqüentes congressos sexuais
resultado gravidez para a sua amada, que acaba dando à luz um filho;
3) Que pretende casar-se com sua amante, mas seu
pai se opõe terminantemente a esse casamento, razão pela qual requer a este
Juízo que supra o consentimento paterno.
O pai do requerente foi citado para, no prazo de três
(03) dias, dar as razões de sua recusa, tendo ele, em tempo hábil, apresentado
a petição de fls. 07, da qual não tomei conhecimento porque não foi subscrita
por advogado. Como o atual C.P.C., se esqueceu de disciplinar a outorga de
suprimento de consentimento para fins de casamento, resolvi agir pelo bom
senso, tendo ouvido, em segredo de justiça e em caráter informal, os nubentes.
O Dr. Promotor de Justiça manifestou-se favorável ao
pedido.
Este é o relatório.
Passo a decidir.
Ouvi, em segredo de justiça, os dois jovens nubentes,
cada um dele per si. Ambos no esplendor dos 18 anos, em plena fartura
sentimental, no apogeu do vigor genético, na explosão de um amor que agride e
aceita, que se dá e que se toma, que clama e
grita e é sufocado, que castiga e é castigado, que corrompe e purifica,
que é doce e é amargo, que é sexo e é espírito, que é luz e é treva, que é anjo
e é demônio, que é enfim, a mais sublime das contradições.
Conversei, primeiramente, com o jovem e fiz-lhe ver as
conseqüências de um casamento tão prematuro e as possibilidades inexoráveis que
decorrem desse contrato sui generis.
Disse-lhe que o amor, por mais forte que seja, não resiste ao prosaísmo do
cotidiano da vida conjugal. Mas ele, que comeu a sobremesa antes do, jantar,
está no inarredável propósito de convolar justas núpcias com a sua bem amada,
legalizando sua união jurídica e socialmente espúria, contrariando, destarde,
Schopenhauer, para quem “ a posse é a
morte do desejo” , e Julio Dantas, que afirmava que “a conquista é tudo, o resto quase nada”.
O moço decidido. Quer legalizar sua situação perante as
leis dos homens e Deus. O seu amor é labareda crepitante de lenha boa, é fogo
que queima até o fim, é relâmpago e é trovoada brava.
O jovem está mesmo apaixonado e eu, parafraseando
Vinícius de Morais, diria que ele quer sua amada seja sua estrela derradeira,
sua amiga e companheira, no infinito deles dois...
Ouvi, depois a jovem, belo exemplar da raça brasileira,
de cuja pele trigueira o cheiro quente da volúpia[1]
exala... Ela, também, ao que percebi, ama profundamente o seu companheiro, de
quem teve filho, “encantado produto de
uma noite de amor, que nasceu de um beijo como nasce da flor o fruto”, na
expressão do magistrado-poeta Vicente de Carvalho.
Os dois se amam e se entendem. “Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos” ,
eis a lição da Raposa ao Pequeno Príncipe de Saint Exupéry. Ninguém melhor do
que os pretendentes ao himeneu[2]
para ver com os seus próprios corações.
Eles já se acham unidos de fato. Já tem um filho. Não
vejo razão para que essa união não possa ser sacramentada pela lei. Por isso, DEFIRO o pedido do requerente e lhe
desejo uma boa sorte e que “o seu destino seja mais belo do que o cantar
das fadas que dançam no arrebol[3]
mais triunfante do que o sol nascente derrubando ao nada muralhas de negrume[4]”,
segundo a imortal elegia de Fagundes Varela.
Expeça-se o competente alvará.
Isento de custas, ex vi legis.
Int.
Ponte Nova, 14 de novembro de 1974
Massillon
de Rezende Teixeira
Juiz de Direito – 2ª Vara
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